Orelhadas sobre músicas, músicos e música

sexta-feira, 13 de janeiro de 2006

marina lima [2006]


ainda é cedo

por Marcus Preto

Cantora carioca traz de volta a São Paulo “Primórdios”, o espetáculo mais elogiado de sua carreira


“Eu quero tudo o que há”, avisava Marina Lima em uma das músicas que apresentou ao público paulistano nas seis sessões de seu show “Primórdios”, em outubro do ano passado. O espetáculo, que unia a música visceral da cantora com elementos de dança, teatro, artes plásticas e outras mídias, foi dirigido por Monique Gardenberg e não deixou uma cadeira sequer do maravilhoso Auditório Ibirapuera ficar vazia. Não era pra menos: Marina construiu ali uma verdadeira experiência sensorial – e muito emocionante – para seu público. Quem via num dia queria voltar no outro. Com isso, claro que as duas semanas em cartaz não deram conta do recado.

A boa notícia é que Marina volta a São Paulo no dia 13 de janeiro para outras seis apresentações e esse retorno vai incluir ainda a gravação de um DVD. O registro era inevitável: todo mundo que ia beijar a cantora no camarim do teatro no final das sessões queria levar o show pra casa, pra vida. Do alto dos seus 50 anos, este é um momento de renovação na história de Marina – e ela sabe disso. Linda, sexy e cheia de energia, a cantora não perde tempo. Ao contrário, usa cada minuto corrido a seu próprio favor.


Você completou 50 anos e nunca esteve tão linda. Como é que o tempo tem trabalhado a sua música, o seu corpo e a sua cabeça?
O negócio é não brigar com o tempo. Até porque ele é relativo... Cada um tem de encontrar o seu ritmo na vida, se adaptar e viver bem com ele.

Alguns artistas que começaram na mesma época que você deram uma encaretada musical, se acomodaram ou sumiram. Você, não. Rola um medo de cair nessa falta de tesão geral com o trabalho que pegou muita gente da música?
Rola é um medo do público se acostumar com essa falta de qualidade - e aí perder o interesse por coisas menos óbvias e só se ligar no imediato. Aí, eu fico sem público. Eu e outras pessoas talentosas por aí.

Em 2004, você freqüentou aulas de Cabala e estava bem interessada no assunto. No que isso se transformou hoje dentro da sua vida?
A Cabala é uma grande sabedoria, e aprender um pouco dela adiantou muito a minha vida. Recorro à Cabala e fico mais confiante no que tenho de fazer. A confiança aumentou, e isso foi fundamental pra mim.

Todo mundo que entende de moda concorda com isso: Marina é uma mulher chique. Como você cuida disso? E como as pessoas “comuns” podem fazer para manter essa coerência com a moda?
Hoje em dia, qualquer um, tendo um mínimo de grana e interesse, pode se manter atualizado. A moda está em toda parte, é só prestar atenção e sair à cata do que se quer. Ver a moda de quem a gente admira também ajuda. Eu gosto de roupas, sempre prestei atenção. A moda traduz a personalidade das pessoas, do mundo. No dia a dia, adoro procurar, me interesso, compro. Mas em shows é bom contar com a ajuda de um profissional. Nesse show "Primórdios", a Érika Palomino foi tudo.

"Primórdios" estreou no ano passado e deixou todo mundo de queixo caído. Agora, volta para São Paulo e deve virar DVD. Você considera esse um momento de renovação na carreira de Marina Lima?
Considero, sim. As músicas novas, uma sonoridade que encontrei com essa banda, o reencontro com a Monique [Gardenberg, diretora do espetáculo], todo o trabalho da equipe, tudo isso foi decisivo. Representa uma grande virada ou, como diz a própria Monique, um grande golpe. [rindo]

Entre tantos assuntos que são colocados no palco, o sexo aparece com destaque. Esse é um momento especialmente sexual na vida de Marina Lima?
Bem, sexo é importante. Mas independentemente de estar praticando ou não, o momento é propício para se falar sobre. Ocorreram mudanças progressistas importantes no mundo, e dar visibilidade a essas questões agora ajuda a fortalecer essas mudanças.

Em "Ana Bella", uma das músicas do show, você pergunta: "Por que as mulheres não podem ter a sua sauna gay?". O verso traz à tona a [ainda] falsa igualdade entre os sexos. É uma espécie de manifesto feminino?
Não, é uma reivindicação mesmo. [rindo] A maioria das mulheres é presa à idéia do amor romântico, como se o sexo só pudesse vir acompanhado de amor. Ora, sexo é uma coisa e amor, outra. Sempre comentei com Cicero [irmão de Marina e um dos seus principais parceiros nas canções] e alguns amigos que seria muito útil as mulheres terem um espaço pra liberar e praticar o desejo. A TPM iria diminuir tanto. [rindo]

Na década passada, você passou por maus bocados por conta de uma depressão. Quando se livrou dela, jurou que não caía mais nessa. Quem passa por isso e "sobrevive" fica vacinado?
Não se morre duas vezes. É uma experiência profunda, onde sente-se muito medo. Você colocou bem: acho que fica-se vacinado.

[entrevista publicada na revista “Quem”, em janeiro de 2006]